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Operação contra Bolsonaro influencia o julgamento da trama golpista? Ele pode ser preso antes? Veja perguntas e respostas
Expectativa é de que STF julgue até setembro os réus pela suposta tentativa de golpe
Alvo de operação da Polícia Federal na manhã desta sexta-feira (18), o ex-presidente (PL) enfrentará nos próximos meses o julgamento da denúncia que envolve a trama golpista. As medidas cautelares impostas pelo ministro influenciam no julgamento? Bolsonaro pode ser preso antes disso? Veja abaixo as perguntas e respostas.
O pedido de hoje é em relação a qual investigação?
O pedido de medidas cautelares feito pela Polícia Federal ao STF se dá na esteira do inquérito que apura a suposta coação e obstrução de Justiça por parte do deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que está nos Estados Unidos. Ao anunciar a decisão, no entanto, o ministro Alexandre de Moraes também mencionou a denúncia contra o ex-presidente e os demais réus pela trama golpista.
“No curso das investigações do INQ 4995/DF (envolvendo Eduardo) e, considerando o final da instrução processual e o início do prazo para alegações finais na AP 2668 (denúncia do golpe), a Polícia Federal representou pela necessidade de decretação de diversas medidas cautelares em face de JAIR MESSIAS BOLSONARO”, explicou o ministro.
Segundo a PF e Moraes, Bolsonaro estaria atuando em parceria com o filho a fim de fazer os Estados Unidos adotarem medidas prejudiciais ao Brasil e tentarem interferir no processo que tramita no Judiciário brasileiro.
O novo episódio pode ter influência no julgamento da trama?
A expectativa é de que o julgamento definitivo de Bolsonaro e dos outros réus do principal núcleo da investigação sobre a trama golpista se dê até setembro.
Investigações criminais, aponta o advogado Berlinque Cantelmo, presidente da Comissão Nacional de Direito Penal Militar da Abracrim (Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas), devem ser “dinâmicas”. O processo, diz, é “sensível ao tempo, às provas e à atuação dos envolvidos”.
— A cada nova diligência autorizada pelo Judiciário, seja por meio de busca e apreensão, quebra de sigilo ou uma oitiva relevante, surgem potenciais novos elementos probatórios: mensagens, vídeos, documentos, planilhas, testemunhos. Se essas provas forem relevantes, podem ser incorporadas ao processo já existente, fundamentar uma nova denúncia ou até justificar medidas cautelares mais severas — afirma. — Embora a operação não seja o julgamento em si, ela pode influenciá-lo direta e profundamente.
Já Guilherme Barcelos, especialista em Direito Político, professor e sócio-fundador da Barcelos Alarcon Advogados, avalia que uma coisa não deveria influenciar a outra.
— Essas cautelares que foram impostas ao ex-presidente são meras cautelares, ainda que contundentes. Se assim fosse, estaria-se utilizando um fato alheio à ação penal do 8 de janeiro para sustentar um decreto condenatório, por exemplo. Além de representar um pré-julgamento, isso quebraria por completo o devido processo legal — alega.
Essa investigação pode gerar nova ação penal?
Os crimes que Moraes cita na decisão de hoje são atentado à soberania nacional, coação no curso do processo e obstrução de investigação de infração penal que envolva organização criminosa. São suspeitas que se somam aos crimes pelos quais o ex-presidente foi denunciado no âmbito da trama golpista.
Agora, portanto, pode ser concebida uma nova ação penal contra Bolsonaro?
— A depender do conteúdo extraído nas novas fases da investigação, o Ministério Público pode optar por apresentar uma nova denúncia, ampliar a peça acusatória já existente ou desmembrar o processo, separando réus e fatos conforme o princípio da individualização — explica Cantelmo. — Portanto, a investigação atual pode sim dar origem a nova ação penal, especialmente se forem identificadas condutas autônomas ou novos crimes ainda não abrangidos pela acusação original.
Bolsonaro pode ser preso preventivamente antes de ser julgado pela trama?
A investigação evitou, até agora, o instrumento da prisão preventiva contra Bolsonaro. Tanto que o uso de tornozeleira eletrônica é uma forma de controlar o réu sem colocá-lo na cadeia.
“O descumprimento de qualquer uma das medidas cautelares implicará na revogação e decretação da prisão”, escreveu Moraes.
Berlinque Cantelmo aponta que a prisão preventiva não exige uma condenação, e sim a análise concreta da necessidade da medida diante dos elementos de cada caso.
— O Supremo já aplicou esse entendimento a ex-presidentes, parlamentares, governadores e empresários. No caso de Bolsonaro, a Corte tem optado, por ora, por medidas menos gravosas como bloqueio de bens, apreensão de passaporte e suspensão de direitos políticos, mas não se pode descartar uma evolução desse quadro, a depender do comportamento do investigado e do conteúdo das novas provas, embora ainda exista ausência de contemporaneidade quanto aos fatos.
Guilherme Barcelos acredita que a preventiva dificilmente ocorrerá, dado que as medidas cautelares determinadas por Moraes são justamente alternativas à prisão.
— Agora, se ele, eventualmente, descumprisse essas medidas cautelares diversas da prisão, elas poderiam sim ser convertidas em prisão preventiva.
Quando e por que é determinado o uso de tornozeleira?
Entre as medidas cautelares impostas a Bolsonaro, que incluem a proibição de deixar Brasília e de se comunicar com o filho Eduardo, está também o uso de tornozeleira eletrônica.
— O uso de tornozeleira eletrônica é requerido basicamente para monitorar o investigado ou o acusado, buscando evitar o descumprimento de outras medidas cautelares impostas a ele, assim como riscos de fuga — observa Guilherme Barcelos.
O uso do equipamento é irrestrito, 24 horas por dia. O ex-presidente é obrigado ainda a estar em casa entre 19h de um dia e 7h do dia seguinte.
O que é o crime de “atentado à soberania” mencionado por Moraes?
Trata-se de uma acusação inédita para Bolsonaro, e foi o próprio ex-presidente quem sancionou a lei que incluiu a tipificação no Código Penal, em 2021. No artigo 359-I do texto, classifica-se como atentado à soberania a atitude de “negociar com governo ou grupo estrangeiro, ou seus agentes, com o fim de provocar atos típicos de guerra contra o País ou invadi-lo”. A pena prevista é de reclusão de três a oito anos.
Bolsonaro, segundo as investigações, atuou para o governo de Donald Trump, dos Estados Unidos, impor sanções ao Brasil e interferir nas apurações que correm no Judiciário. Eduardo Bolsonaro está morando naquele país e se movimenta por lá com interlocutores de Trump.
Nos últimos dias, o americano mencionou mais de uma vez o processo contra Bolsonaro para justificar as tarifas de 50% impostas ao Brasil. A carta do republicano enviada ao presidente Lula, segundo o ministro do STF, também é “atentatória” à soberania nacional e contém “claras e expressas” ameaças ao Judiciário.
Sancionada em setembro de 2021 pelo então presidente brasileiro, a lei 14.197/21 revogou a Lei de Segurança Nacional (LSN) e definiu novos crimes contra o Estado Democrático de Direito. Entre eles, além do atentado à soberania, estão outros que são usados contra Bolsonaro e os réus do 8 de janeiro, como abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado.