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Copa do Mundo de Clubes: disparidade física entre europeus e brasileiros diminui

Mundial mostra que futebol do país tem conseguido igualar métricas importantes, mas ainda esbarra em questões sociais, falta de acompanhamento nutricional, suplementação adequada e estrutura mínima em formações de base

Por Agência O Globo - 07/07/2025
Copa do Mundo de Clubes: disparidade física entre europeus e brasileiros diminui
(Foto: )

Ao longo dos confrontos que o antigo formato do Mundial de Clubes teve entre brasileiros e europeus, o campo quase sempre mostrava uma distância nítida na parte física que pendia às equipes do Velho Continente: chegavam no meio de suas temporadas com mais intensidade, energia, e tinham, nitidamente, jogadores mais fortes em compleição. Com a estreia do novo formato, neste ano, a questão do calendário se inverteu: os brasileiros chegaram em meio de temporada e os europeus, no fim dela. Ao mesmo tempo, as diferenças físicas parecem ter se equilibrado mais, mas os europeus ainda mandam em alguns dos números importantes nesta questão.

O GLOBO analisou algumas das métricas detalhadas nos relatórios dos jogos feitos pela Fifa. Em dados que que levam em conta a parte física, direta ou indiretamente, o Palmeiras foi o clube que mais equilibrou uma partida com um clube europeu: contra o Porto, que terminou em 0 a 0 na fase de grupos. Teve mais posse (48,7% a 40,6%), ganhou mais as segundas bolas (74 x 53), passou mais tempo em pressão alta (6% contra 2%) e média (4% contra 3%) e fez mais contra-pressão: 13% contra 10% dos portugueses. Por fim, levou menos tempo para recuperar a posse de bola: 13,27 segundos, em média, contra 13,54 segundos dos adversários. Foi o único brasileiro a liderar este último quesito.

Perto do alviverde ficou o Flamengo, que cobriu distância maior (106,2 a 99,7km), teve mais ações de pressão (218 a 215) e passou mais tempo fazendo pressão em bloco médio (6% a 5%) que o Chelsea. Venceu por 3 a 1 na fase de grupos. Contra o Bayern, nas oitavas, quando perdeu por 4 a 2, teve mais posse de bola (46,8% a 45,5%), ações de pressão (271 x 255) e pressão em bloco médio (7% a 5%).

Corrida contra o tempo

Para Altamiro Bottino, coordenador científico do Cuiabá e com passagens por outros grandes clubes do país, é preciso analisar os contextos das partidas. Segundo ele, muitas vezes, impressões, como um suposto cansaço, não se aplicam de fato:

— Nem sentados na beira do campo, usando todos os recursos tecnológicos, a gente consegue fazer essa afirmação, falar que o time cansou. Não existe dizer que se o cara fez um gol no último minuto do jogo, é porque o time dele está bem fisicamente e o outro está cansado. Nenhuma estatística até hoje conseguiu fazer uma correlação significativa.

Quanto a questões de desenvolvimento físico díspar, o gargalo entre a parte física de Brasil e Europa pode estar na formação.

De acordo com Bottino, a busca (e a ida) cada vez mais cedo de jogadores brasileiros pelos times europeus é uma consequência de questões sociais do país, como condições de saúde, educação e até de segurança nas fases de crescimento e formação dos talentos por aqui:

— O clube tem que cumprir o papel do Estado em muitos momentos dessa formação. Só que a gente corre contra o tempo, tenta corrigir coisas que não são mais possíveis. Era para ter sido feito quando ele tinha de zero a 5 anos, depois de 5 até 10. Mas a gente vai fazer com um cara de 17, que é quando o clube percebe que o garoto tem talento e vai tentar dar a ele salário, condições de treinamento.

Essas dificuldades na base também são ressaltadas por Thais Verdi, nutricionista e especialista em performance e genética esportiva. Segundo ela, a falta de acompanhamento nutricional, suplementação adequada e estrutura mínima em formações de base comprometem atletas do futebol brasileiro. Muitos, segundo ela, chegam aos clubes profissionais “com déficits nutricionais importantes, baixa massa muscular relativa e menor resistência a lesões”.

— Isso compromete a construção de atributos físicos essenciais ao alto rendimento, como força, potência e capacidade de recuperação. Embora seja possível reverter parte desse quadro posteriormente, esse processo de “ganhar corpo” em idade já avançada é mais difícil e pode não atingir o potencial máximo do atleta. Em outras palavras, a janela de oportunidade de maturação biológica e motora, que ocorre principalmente na adolescência, acaba sendo desperdiçada. Por isso, na fase adulta, vemos tantos jogadores com lesões e cirurgias em idades tão jovens — explica.

Alta tecnologia

Enquanto isso, o futebol europeu tenta ser cada vez mais cirúrgico em seus processos de formação. Além de questões como estilo de vida e formação com acompanhamento de fisiologia e nutrição desde cedo, testes genéticos e biomoleculares já são adotados por clubes europeus e centros de alto rendimento. Verdi diz que na Inglaterra, Espanha e Alemanha tem se utilizado esses testes para personalizar treinos, ajustar cargas, prever riscos de lesões e planejar estratégias nutricionais:

— Não é apenas para revelar grandes talentos, mas principalmente para não desperdiçá-los.